sexta-feira, 13 de abril de 2012

FIM DE FESTA


TALVEZ HAJA SILÊNCIO,

MAS NUNCA TRISTEZA.

DAQUI A POUCO COMEÇA

TUDO OUTRA VEZ...

ESTAÇÃO PRIMEIRA DE MANGUEIRA


Não há nenhum exagero em se afirmar que o morro da Mangueira é uma comunidade a serviço do samba. Por entre os seus barracões, nas vielas tortuosas e lamacentas, nas conversas entre famílias, nos papos de passatempo, entre uma cerveja e outra, à volta do balcão do boteco Só Para Quem Pode, o samba é o denominador comum. Ele soma, junta reúne, nunca divide, pelo menos de maneira irremediável.

A sede da Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira – o Palácio do Samba – assemelha-se a uma fortaleza vigilante, uma atalaia que se ergue sobre o morro, atraindo a todos de lá e de fora, quando o apito trila e surdos e tamborins, tal como sinos dobrando festivos, anunciam que o samba vai começar.

Lá por volta de 1927, quando a grande força do carnaval carioca eram os blocos, existiam no morro de Mangueira três grupos que mediam forças: os Arengueiros, Mestre Candinho e Tia Tomásia, sendo os dois últimos terreiros de macumba que reuniam os seus filhos-de-santo no carnaval e saíam como blocos. Aos atabaques e agogôs juntavam-se cuícas e pandeiros, e as saias engomadas e brancas das baianas rodopiavam ao som de um samba sacudido, em geral curto e de coro fácil.

Os Arengueiros tinham esse nome porque os seus componentes não dispensavam uma catimba, uma arenga em boas condições, se bem que fossem muito bons de samba. Faziam parte do bloco alguns “moleques bambas”, denominação comum na época para alguns que depois fariam sucesso como compositores. E entre eles basta citar Angenor de Oliveira e Carlos Moreira de Souza, ou melhor, Cartola e Carlos Cachaça.

Naquela época, os blocos, além da força que representavam no carnaval, eram também uma demonstração da unidade dos bairros onde eram formados. Famílias inteiras, de ruas inteiras, saiam para visita de cordialidade a outras ruas e outros bairros numa animação contagiante e crescente.

Como o morro de Mangueira estava tripartido, criando uma competição que o enfraquecia, Cartola propôs e conseguiu a fusão dos três blocos, tendo surgido então o Bloco Carnavalesco Estação Primeira de Mangueira, no dia 28 de abril de 1929. O nome do bloco foi dado pelo próprio Cartola, mas as cores verde-e-rosa foram escolhidas por dona Lucíola Ribeiro de Jesus, que na época saía nos Arengueiros e até hoje sai na Mangueira.

Daí para cá a Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira veio acumulando prestígio e vitórias, criando em torno de sim uma aura alimentada pelos seus integrantes e pelo povo que aplaude a sua passagem no desfile e canta os seus sambas com vigor e ardor.

“Ô, ô, ô, ô, a Mangueira chegou, ô, ô!!!”

CARLOS CACHAÇA, MAÇU & CARTOLA


Eis aí uma trindade santificada por todos os mangueirenses: Carlos Cachaça, Maçu e Cartola. Marcelino José Claudino, o tio Maçu, foi o primeiro mestre-sala da escola, temido pelas magistrais pernadas que sabia aplicar quando se formava uma roda de samba. Um bamba de verdade.

DONA NEUMA


Além da sede da escola, há outro local que congrega todos os acontecimentos sociais, recreativos e até mesmo sentimentais do morro: é a casa da dona Neuma, mangueirense histórica, filha de Saturnino Gonçalves, primeiro presidente da agremiação, e desde jovem pastora sestrosa. Nenhuma visita é válida, nenhuma pesquisa será completa, nenhuma informação será integral, se dona Neuma não for consultada.

Apesar de ter uma família numerosa, dona Neuma é o poço comum para onde convergem todos os problemas, todas as aflições, todas as dúvidas do pessoal da Mangueira. Na preparação do carnaval a sua colaboração é inestimável, na época das eleições o seu apoio é cortejado por todos. E ela está sempre com o sorriso à mostra, animando confortando, com uma palavra de carinho ou uma cervejinha gelada.

Até bem pouco tempo o seu telefone era o único existente no morro, o que dava à sua residência um permanente ar de festa. Era gente entrando e saindo, para falar ao telefone ou buscar um recado. A um recém-chegado não informado a impressão era que todo mundo pertencia à família de dona Neuma dado a intimidade com que todos tratavam e eram tratados. O fato de já haver atualmente outros aparelhos instalados não significa que o panorama mudou. A casa de dona Neuma continua sendo o centro nervoso do morro, antes, durante e depois do carnaval.

DARCI & CLEMENTINA


A Mangueira tem muitos motivos para justificar o orgulho, um deles é a sua Ala de Compositores na qual pontifica, por exemplo, o Darci, cuja consagração já seria suficiente com este simples dado: é um dos autores do samba “O Mundo Encantado de Monteiro Lobato”, com o qual a escola desfilou o primeiro lugar em 1967.

Outro motivo de orgulho para a Estação Primeira é sua ex-pastora Clementina de Jesus, contemporânea de Heitor dos Prazeres, Paulo da Portela, Gradim e outros pioneiros, frequentadora da casa de Tia Ciata, cantora de novenas, ladainhas, jongos e pontos de macumba.

WALDOMIRO


A bateria da Mangueira é reconhecível à distância. Desde 1935 que ela é dirigida pelo mesmo homem: Waldomiro José Pimenta, para quem nenhum instrumento de percussão tem segredo. Ele encoura e toca qualquer um, em pleno desfile é capaz de saber se um ganzá sobrou na virada do samba ou se um agogô errou na batida do tempo forte.

Em mais de 40 anos de atividade hoje Waldomiro já é um mito em frente à bateria, mas não pense que lhe falta vigor. Ele é ainda capaz de ensinar a tocar um tamborim ou um repinique e está sempre preocupado em formar novos percussionistas.

NEIDE & DELEGADO


Neide e Delegado: um autêntico “pas-de-deux” proporcionado por dois bailarinos populares, num misto de ritmo, elegância e alegria.

XANGÔ DA MANGUEIRA


Na difícil arte de improvisar versos numa rodada de partido alto, muitos tentam e poucos se destacam. Xangô da Mangueira, nascido Olivério Ferreira, é um dos que mais se destacaram e que tem o seu nome pronunciado com respeito por todos os sambistas.

Foi na Portela que ele se impôs como partideiro quando, em 1935, fazia parte daquela escola. Com a saída de Paulo da Portela para a Lira do Amor, ele acompanhou o mestre só entrando na Mangueira em 1939, onde está hoje.

Depois de ter entrado para a ala dos compositores, Xangô foi também o puxador de samba-enredo no desfile até 1951, quando passou o posto para Jamelão. Daí em diante ele assumiu a direção de harmonia da escola, substituindo Cartola, e está firme até hoje comandando o canto e a evolução de passistas, pastoras e alas. E na hora de tirar um partido, é com ele mesmo:

Cantei muito samba
Eu já fui batuqueiro
E na roda de samba
Fui diretor de terreiro!

PORTELA


Entre 1924 e 1925, na casa de dona Ester, em Osvaldo Cruz, ensaiava o Bloco Come Mosca. A rapaziada do local, muito alegre e desinibida, contava com a boa vontade da dona da casa e, no quintal, se divertia fazendo passos de samba e improvisando versos. Mais tarde, no mesmo bairro, surgiu o Bloco Osvaldo Cruz, frequentado pela chamada “turma de Bento Ribeiro”: Heitor dos Prazeres, Manuel Gonçalves Natalino José do Nascimento, o Natal, e Paulo Benjamim de Oliveira, que entrou para a história do samba como Paulo da Portela.

O bloco além de brincar pelas ruas do bairro, desfilava na Pra Onze, tendo ganho em 1927 uma taça que veio decorada com fitas azuis e brancas, cores logo adotadas pelos integrantes, e que seriam mais tarde as da Portela. Pouco depois o bloco mudou de nome. Passou a se chamar Bloco Vai Como Pode, e venceu os concursos da Praça Onze, organizados pelos jornais A Pátria e A Nação, nos anos de 1929, 1930,1931 e 1932.

Foi em 1925 que o então prefeito da cidade do Rio de Janeiro, o Dr. Pedro Ernesto, oficializou os desfiles de carnaval. Blocos de diversos bairros apresentavam-se lá na Praça Onze, na época o maior reduto do samba e do carnaval. A disputa era acirrada, os ânimos também. No final, quando o resultado era proclamado, e o era logo após o desfile, as discussões degeneravam em conflito e muita gente mergulhava – ou era mergulhada – no canal do Mangue, numa antecipação do agora conhecido refrão: “Quem samba fica, quem não samba vai embora.”

Naquele ano, o primeiro dos desfiles oficial, o Vai Como Pode foi campeão com o enredo O Samba Dominando o Mundo, tendo ficado em 2º lugar a Mangueira, em 3º, Prazer da Serrinha (atual Império Serrano) e em 4º lugar, a Vizinha Faladeira.

A esta altura já havia uma grande confusão nas denominações bloco e escola de samba. O Vai Como Pode já era conhecido não-oficialmente como Escola de Samba Portela, já que o outro título não agradava ao delegado Dulcídio Gonçalves, autoridade encarregada de dar licença para as agremiações desfilarem. Mas só em 1939 é que foi adotado definitivamente o nome de Grêmio Recreativo Escola de Samba Portela.

Pioneira e renovadora, a Portela foi a primeira escola a usar corda para evitar intrusos, e também a primeira a apresentar alegoria, porta-bandeira e mestre-sala, comissão de frente, enredo, bateria fantasiada e surdo de marcação. É também a única escola heptacampeã (1941 a 1947).

domingo, 8 de abril de 2012

PAULO DA PORTELA, RUFINO E CAETANO


Três pilares sobre os quais se erguem as tradições, as lutas, as conquistas e as glórias da Portela: Paulo da Portela, Antônio Rufino e Antônio Caetano. Paulo, também conhecido como Príncipe Negro, foi o introdutor do enredo nas escolas de samba, Rufino criou as finanças da Portela e Caetano é o autor do símbolo da escola: a águia.

NATAL


A Portela deu ao samba uma figura definitiva e dificilmente superável: Natalino José do Nascimento, o Natal. Um dos fundadores da escola e batalhador incansável até o dia em que faleceu, 8 de abril de 1975, ele foi um líder inconteste.

Paulista de nascimento, tendo nascido na cidade de Queluz, em 1905, Natal antes de conhecer o Rio conheceu Madureira. E lá foi sua fortaleza e cenário para a sua vida que conheceu os extremos da pobreza e tranquilidade do dinheiro farto. Ele mesmo declarou certa vez: “Meu dinheiro ia uma parte para minha família, outra para a escola e o resto eu distribuía para quem precisasse.”

Figura humana que impressionava no primeiro contato, Natal viu criar-se em torno dele um folclore vasto e rico. A sua vida, o seu entusiasmo, cevaram-se na paixão que ele porejava pela sua escola, a azul e branco, a da águia alva e altaneira. Carnavalesco convicto, sambista indomável, sem nunca ter composto um samba, tocado uma caixa de fósforos ou sambado num terreiro, poucos fizeram pelo samba o que ele fez.

Dava gosto vê-lo nos confortáveis chinelos, paletó de pijama, chapéu à cabeça, tendo o cumprimento dado pelo braço que lhe restava ser disputado por autoridades, políticos, madames de sociedade e componentes de outras escolas, no dia do desfile. Ele vinha à frente de sua gente, jamais houve melhor abre-alas, era um símbolo de força e de amor. De amor à sua escola, ao seu enredo, ao seu samba, ao nosso carnaval.

Natal costumava contar que se fantasiou somente uma vez em toda a sua vida. Foi num banho de mar à fantasia em Copacabana (Posto 4), organizado pelo jornal A Noite, e mesmo assim ele vinha dentro de uma burrinha (disfarce que dominou o carnaval carioca durante uma época).

Primo de Paulo da Portela e de quem se considerava um discípulo, nos primeiros desfiles da Praça Onze ele era da brigada de choque da Portela. Não enjeitava parada. E assim foi até o último dos seus dias, quando foi acompanhado até a derradeira morada por uma multidão incalculável que acenava lenços brancos, como a sua águia, que tantas alegrias lhe deu.

ALCIDES, ALVARENGA E ALVAIADE


Três bambas da Portela desde os seus primeiros dias: Alcides Dias Lopes, também conhecido como Malandro Histórico, porque sabe de cor toda a história da escola, Ernani Alvarenga, autor de Lá Vem Ela Chorando, o primeiro samba que a Portela cantou na Praça Onze e Osvaldo dos Santos, o Alvaiade, um dos primeiros puxadores de samba da Portela.

MANACEIA, CHICO SANTANA E WALTER ROSA


Até hoje a Portela é das escolas que tem uma respeitável ala de compositores. Na chamada Velha Guarda estão alguns verdadeiros craques como Manaceia, Chico Santana e Walter Rosa, todos atuando com a mesma disposição e o mesmo talento dos primeiros dias do Conjunto de Osvaldo Cruz.

VENTURA E JOÃO DA GENTE


Nos primitivos desfiles era muito comum a ala das baianas vir engrossada por alguns homens. Na Portela houve duas “baianas” famosas: seu Ventura e seu João da Gente. Os dois foram também notáveis tiradores de versos e puxadores de samba enredo, quando ainda não se usava microfone e amplificação. Era no gogó.

ZÉ KÉTI


José Flores, Zé Flores, Zé Quentinho, Zé Kéti, um dos primeiros compositores de escola de samba a romper o cerco das gravadoras, que durante muito tempo impediu que autores de talento e músicas de verdadeira origem popular chegassem ao grande público.

Ainda muito menino foi levado para a Portela pelo Armando Santos que também era compositor e depois foi presidente. Em contato com Alvaiade e outros compositores ele foi desencabulando pouco a pouco até ter coragem de mostrar um samba seu. E agradou muito.

Lá vem a Portela
Com suas pastoras
Alegres a cantar
Oba ioiô, oba laia,
Não tememos o vento
Nem a tempestade,
Nem as lindas ondas do mar.
Chega, deixa isso pra lá.


A carreira de Zé Kéti como compositor é de todos conhecida. Leviana, A Voz do Morro, Opinião, Máscara Negra, são apenas alguns dos sucessos que todos cantam e cantarão sempre. A sua linguagem é simples, mas nem por isso desprovida de intenção e poesia.

WILSON MOREIRA E MONARCO


Dois compositores que ajudam a manter viva a legenda da Portela de possuir um caudaloso naipe de autores de samba de quadra e enredo.

PAULINHO DA HARMONIA


Uma das figuras mais importantes e características na história mais recente da Portela é o Paulinho, atualmente um dos diretores de harmonia da escola e que já foi um passista notável, de ginga elegante e passos surpreendentes. É um portelense nato, tanto assim, que para a alegria dos seus amigos de vez em quando ainda diz alguma coisa no pé.

IMPÉRIO SERRANO


O morro da Serrinha, em Vaz Lobo, já foi um ponto importante na geografia carnavalesca da cidade. Houve certa época em que, no mês de outubro, já se ouvia os primeiros trinados do apito que comandava os ensaios frequentados religiosamente pelas moças e rapazes da vizinhança. A brava e simpática escola de samba Prazer da Serrinha reunia um grupo dedicado e animado, do qual faziam parte Alfredo da Costa, o fundador, Delfino Coelho, Cafua do Trombone, Mano Décio da Viola, Fuleiro, Carlinhos Bem-te-vi e Sebastião de Oliveira, o Molequim.

Foi no carnaval de 1945, quando depois de ter ensaiado o samba-enredo A Conferência de São Francisco, de Mano Décio e Silas de Oliveira, aliás, o primeiro samba da dupla, a escola foi obrigada a cantar outro intitulado Alto da Colina, por ordem do presidente Alfredo Costa, que houve a cisão. A escola foi desclassificada e o mal-estar que já havia contra a ditadura do seu Alfredo cresceu e explodiu.

Na Quarta-feira de Cinzas daquele mesmo ano, durante o almoço de confraternização, tradição que ainda hoje é cultivada por algumas escolas de samba, Sebastião Molequim fez um samba, e samba-protesto, narrando o incidente que tanto prejudicou a Prazer da Serrinha. Não foi difícil arranjar um lápis e um papel para que o próprio Molequim recrutasse as assinaturas dos que estavam de acordo com a formação de uma outra escola de samba, e ali mesmo nascia a Império Serrano.

O Mano Elói (Elói Antero Dias), que acabava de participar da extinção de outra escola de samba, a Deixa Malhar, e tinha todas as peças da bateria, aderiu imediatamente à nova agremiação, que elegeu como primeiro presidente o João de Oliveira Gradinho e tinha na diretoria figuras como o Sebastião Molequim, o compositor Silas de Oliveira, o próprio Elói e muitos outros.

A primeira reunião da nova escola foi realizada na casa de dona Eulália Nascimento, e lá foram escolhidos o nome da escola e as cores do seu pavilhão. Sebastão Molequim sempre afirmou que a escolha do nome teve relação direta com o titulo de uma outra agremiação, a Império da Tijuca, e foi ele quem propôs as cores azul e amarelo-ouro, que não foram aceitas.

A sugestão do verde-e-branco partiu de Antenor Rodrigues, autor do primeiro samba da escola, que diz:

O branco é a paz,
O verde, esperança.
Diz o ditado
Quem espera sempre alcança
E alcancei.
Império, por ti tudo farei.

MESTRE FULEIRO


Integrado na Prazer da Serrinha, até por motivos familiares, só depois da fundação é que Antônio dos Santos, o Mestre Fuleiro, foi para a Império Serrano, levado pelo seu compadre Mano Décio da Viola. Diretor de harmonia dos mais antigos e eficientes, Fuleiro é um patrimônio do Império.

SILAS DE OLIVEIRA


Cada arte tem um mestre, e na arte de fazer samba-enredo Silas de Oliveira foi um mestre. Pegue-se ao acaso um samba seu e estaremos diante de uma obra de inspiração e acabamento quase artesanal. Só ou com parceiros, dos quais Mano Décio foi o mais constante, Silas deixou um legado que honra a todos os sambistas.

MANO DÉCIO DA VIOLA


Para Décio Antônio Carlos, o Mano Décio da Viola, bastaria o samba-enredo Tiradentes para colocá-lo em lugar de distinção na galeria dos grandes sambistas. Acontece que a sua participação na história do Império Serrano é também importante e intensa. Descobridor e parceiro de Silas de Oliveira, o Império já desfilou 19 vezes, e em muitas foi campeã com sambas de sua autoria.

DONA IVONE LARA


Compositora desde os doze anos de idade, na época em que se homem metido no samba era malvisto, imaginem mulher, dona Ivone Lara custou a ver o seu talento reconhecido. Mas valeu a pena esperar. Hoje ela é uma autora requisitada e uma intérprete aplaudida. Tocando o seu cavaquinho ou rodopiando a sua fantasia de baiana, é uma alegria vê-la com seu passo miudinho e o seu sorriso largo.

OLEGÁRIA


A primeira escola de samba a apresentar um destaque na forma em que conhecemos hoje, isto é, com muito luxo e requinte, foi a Império Serrano. E foi uma mulher quem apareceu com a novidade. Olegária dos Anjos Filho, casada com Calixto, que inventou os pratos de metal na bateria de escola de samba. Como se vê, um casal que uniu nome à escola.

ACADÊMICOS DO SALGUEIRO


Em 1927, Lindenbergh cruzava o Atlântico, o Spirit of Saint Louis invadia o mundo, Sacco e Vanzetti eram executados, o espírito da solidariedade comovia o mundo, Leon Trotsky era expulso do Partido Comunista, o espírito da dissenção preocupava o mundo. No morro do Salgueiro, eram vários os agrupamentos de samba, o mundo nem tomava conhecimento.

O Bloco Terreiro Grande, que levava as cores azul e rosa, reunia a preferência da maioria: nas batalhas de confete que se realizavam na Tijuca sempre fazia bonito. Foi Antenor Gargalhada quem liderou uma ala dissidente do Terreiro e fundou o bloco Azul e Branco do Salgueiro. A estas alturas o Terreiro mudou o nome para Unidos do Salgueiro, conservando, no entanto, as cores azul e rosa. Outro bloco surgiu ainda, o Depois Eu Digo (verde e branco), aparecendo como tertius na opção que os habitantes do morro podiam fazer.

Esta multiplicidade de blocos levou o sambista Totico a sugerir, em 1953, a fusão dos três para fortalecer o samba no morro. Mas os Unidos do Salgueiro não aceitaram a idéia que, entretanto, foi subscrita pelo pessoal do Azul e Branco e do Depois Eu Digo, nascendo então o Grêmio Recreativo Escola de Samba Acadêmicos do Salgueiro, existente na Chacrinha, local vizinho ao morro do Salgueiro e que, motivado e sensibilizado pela escola de suas cores, também aderiu aos Acadêmicos.

A fundação oficial deu-se em março de 1953, tendo sido eleito como primeiro presidente Paulinho de Oliveira, que se dedicou inteiramente à total integração do Salgueiro. No carnaval de 1954 a escola obtinha o terceiro lugar com o enredo Romaria à Bahia. Daí em diante, o Salgueiro marcou sempre a sua presença nos desfiles, até que em 1959 chegou em terceiro lugar com o enredo Viagens Pitorescas Através Do Brasil, que ficou conhecido como “Debret”.

Os figurinos, ou riscos, como os denominam os componentes das escolas de samba, e as alegorias foram um trabalho do casal Dirceu e Maria Luisa Nery, artistas plásticos de inquestionável vivência popular. O inspirador do enredo foi Nelson de Andrade, que a partir dali abria uma enorme senda e fixava um marco na história das escolas.

CASEMIRO CALÇA LARGA


Quando o Salgueiro, Sal para os íntimos, levantou o seu primeiro campeonato, em 1963, com o famoso enredo Chica da Silva (antes, em 1960, numa decisão do então Departamento de Turismo e Certames, considerada política pelos sambistas, o Salgueiro dividiu o primeiro lugar com Mangueira, Portela, Unidos de Lucas e Império Serrano), o diretor de harmonia da escola era Joaquim Casemiro, grande figura e líder do morro, falecido quando dirigia um ensaio e que ficou na história do samba como Casemiro Calça Larga.

DUDUCA, IRACU SERRA, GERALDO BABÃO, DJALMA SABIÁ E NOEL ROSA DE OLIVEIRA


O Salgueiro, este mar vermelho-e-branco que invade as ruas no domingo de carnaval, tem compositores cujos trabalhos têm aos seus componentes. Aqui está um quinteto de autênticos cobras, criadores de indiscutível talento: Duduca, Iracy Serra, Geraldo Babão, Djalma Sabiá e Noel Rosa de Oliveira.

Muitas obras-primas eles fizeram, dessas que o povo canta sempre, o que determina a sua permanência na memória coletiva. Citemos apenas alguns dos seus sambas: Navio Negreiro (1957), de Djalma Sabiá; Vida e Obra de Aleijadinho (1961), de Duduca e Bala; Chica da Silva (1963), de Noel Rosa de Oliveira e Anescarzinho e História do Carnaval Carioca (1965), Geraldo Babão.

Na ala dos compositores do Salgueiro ainda tem gente como Zuzuca, Bala, Nilson Nobre, Ney Lopes e Zé Di. Todos integrados no dístico da escola: Nem melhor, nem pior, apenas uma escola diferente.

TEM MAIS ESCOLAS...


A via férrea que passa em Parada de Lucas dividiu por muito tempo o samba do local. Esta divisão não era somente geográfica, era muito mais. Era a irreconciliável rivalidade entre duas escolas de samba que disputavam a preferência dos habitantes daquele subúrbio.

Os encontros, evitados sempre que possível, degeneravam numa pequena batalha onde partilhavam todos, e que só terminava quando cada grupo recuava até a linha divisória.

No dia do desfile, o grande objetivo das duas não era propriamente o primeiro lugar, mas sim a colocação na frente da outra. Era um campeonato particular.

Esta disputa durou apenas 33 anos, até que, em 1º de maio de 1966, foi homologada a fusão e, dai em diante, Aprendizes de Lucas e Unidos da Capela transformaram-se na escola de Samba Unidos de Lucas.

A idéia da fusão já existia há uns vinte anos, mas nenhuma diretoria de qualquer das duas agremiações aceitava consumá-la. Muita conversa ao pé do ouvido, emissários que iam e vinham de lado para o outro, papos nos botequins da redondeza, mas quando parecia que tudo estava resolvido aparecia sempre alguém para dizer: “Fusão sim, mas só se a sede for em cima da linha do trem!”.

José Serrão, mais conhecido como Cartola, atesta que a escola Aprendizes de Lucas foi fundada em 1933, em frente à padaria da esquina das ruas Cordovil com Lucas Rodrigues, onde a turma que jogava pelada todos os domingos se reunia ao cair da noite. O nome da escola foi conhecido pela primeira vez em 1935, quando com cerca de 200 pessoas ela participou do desfile na Praça Onze.

A criação dos Aprendizes determinou o nascimento, na outra margem da linha do trem, dos Unidos da Capela. Isto em 15 de Janeiro de 1933. Já existia no local a agremiação Capela Futebol Clube, desde 1928, e em 1926 o bloco virou escola desfilando pela primeira vez com enredo Sonho de Ópio, sendo campeã em 1950 com o enredo Homenagem ao Esporte Nacional.

No carnaval de 1968 surgia no desfile da Avenida Presidente Vargas uma nova escola e com as cores amarelo e vermelho: Unidos de Lucas, batizada na Matriz São Sebastião de Lucas e tendo como padrinhos a cantora Elizete Cardoso e o poeta Vinicius de Moraes que, impedido de comparecer, foi representado por outro poeta: Hermínio Bello de Carvalho. Em diversos carnavais Elizete desfilou com a Unidos de Lucas, mesmo quando a escola desceu para o segundo grupo.

À Unidos de Lucas, se não tivesse outros motivos para ter o seu nome inserido entre aqueles das escolas que acrescentaram fatos positivos à história do samba, bastava um: o samba enredo História do Negro no Brasil, mas conhecido como Sublime Pergaminho, de autoria de Zeca Melodia, Nilton Russo e Carlinhos Madruga. É uma das mais perfeitas sínteses e um dos mais pungentes cânticos da saga do negro em terras brasileiras.

ELTON MEDEIROS


Poucos conseguem fazer ritmo de samba numa caixa de fósforo como Elton Medeiros, compositor-fundador da Unidos de Lucas e autor de sambas de inconfundível caráter e personalidade, onde ele expõe com lucidez e precisão a sua visão do mundo e do samba.

O ano era 1945, mês de maio, fim da Segunda Guerra Mundial, o povo comemorava cantando e sambando. Pelas ruas de Nilópolis um bloco famoso fazia a sua peregrinação de bar em bar, era o Bloco do Irineu Perna-de-Pau, que costumava sair durante o carnaval. Tempos depois Irineu faleceu e os seus liderados ficaram desnorteados.

Na noite de Natal de 1948, em casa de D. Eulália de Oliveira, os remanescentes do bloco estavam reunidos e, entre copos de vinho tinto e rabanadas, resolveram fundar a Associação Carnavalesca Beija-flor, o pássaro preferido de D. Eulália, que foi quem sugeriu o nome.

Seu filho Milton, o Negão da Cuíca, foi aclamado presidente e já no ano seguinte saia às ruas do local o novo bloco com as cores azul e branco, herdadas do agrupamento do finado Irineu. Com a adesão de mais gente e o inevitável crescimento a Associação tornou-se escola de samba em 1951 desfilando, com o enredo Libertação de Nilópolis. Começava ali a grande trajetória da escola que estava destinada a terminar com a hegemonia das chamadas quatro grandes (Mangueira, Portela, Império e Salgueiro).

Somente em 1952 é que a Escola de Samba Beija-flor desceu à cidade e apresentou-se no desfile da Praça Onze, entre as do segundo grupo. Ora subindo para o primeiro, ora descendo para o segundo, a escola foi adquirindo forma e coesão, até que em 1974 firmou-se entre as do desfile principal com o enredo Brasil Ano 2000. Mas o grande acontecimento deu-se em 1976, quando Joãozinho Trinta tendo saído do Salgueiro, foi convidado pelo presidente Nelson Abraão David e fez na Beija-flor o enredo Sonhar Com Rei Dá Leão, focalizando com malícia e espírito cariocas uma das grandes instituições do Rio de Janeiro: o jogo do bicho.

Ninguém resistiu à beleza dos figurinos de Viriato Ferreira e às alegorias do Joãozinho, animadas por um contagiante samba de Neguinho da Vala. E a Beija-flor foi a campeã de 1976, quebrando uma escrita de anos, rompendo o cerco das quatro que se revezavam no primeiro lugar. Em 1977 e 1978, o fato viria se repetir e o ex-bloco de Irineu Perna-de-Pau, agora é uma poderosa escola, que tornou-se tricampeã do carnaval carioca.

Sonhar Com Rei Dá Leão (1976), Vovó e o Rei da Saturnália (1977) e Criação do Mundo na Tradição Nagô (1978) são enredos que se tornaram inesquecíveis pela concepção e pela realização.

JOÃO TRINTA


O Salgueiro foi campeão em 1969 com o enredo Bahia de Todos os Deuses, sem dúvida uma das grandes vitórias da escola pela ousadia de suas concepções e a coragem de arriscar em conceitos nada ortodoxos. Naquele desfile houve duas criações memoráveis, uma Iemanjá prateada concebida por Arlindo Rodrigues e os adereços usados pelos componentes, imaginados e executados por Joãozinho Trinta, ex-bailarino do Teatro Municipal e habilidoso criador artesanal.

Até então anônimo, João começou a se destacar graças ao seu talento sempre incentivado por Fernando Pamplona e Arlindo. Alguns anos mais tarde, com a saída deste dois do Salgueiro, Joãozinho assumiu a função de carnavalesco e fez enredos tão memoráveis quanto discutidos: As Minas do Rei Salomão (1974) e Rei da França na Ilha da Assombração (1975).

Foi a ida de Joãozinho Trinta e Viriato Ferreira para a Beija-flor que deu a grande virada nesta escola. Profundo conhecedor do carnaval e de sólida cultura popular, João realizou com o tricampeonato da azul e branco de Nilópolis uns dos mais belos desfiles de toda a história das escolas de samba.

É na rua Teodoro da Silva, onde o compositor Noel Rosa nasceu e morreu, que ensaia o Grêmio Recreativo Escola de Samba Unidos de Vila Isabel. Única no bairro tido e havido como um dos redutos do samba urbano, a Vila congrega os moradores do local, além de muitos do Grajaú, Andaraí e Tijuca, que desfilam ou simplesmente torcem pelas cores azul e branco.

O seu fundador foi Antonio Fernandes da Silveira, o China, que veio do morro do Salgueiro, onde pertencia à escola verde e branco. Com a sua experiência e capacidade de arregimentação, não foi difícil criar as bases de uma nova escola, que seria fundada no dia 4 de abril de 1946 com o nome do novo bairro que ele tinha adotado. Como sempre, os primeiros elementos provinham de um bloco, célula primeira de todas as escolas de samba, e nesse caso particular foi o Azul e Branco, que brincava no Boulevard 28 de Setembro e ruas adjacentes.

Com cerca de 200 componentes, a Unidos de Vila Isabel desfilou pela primeira vez na Praça Onze, em 1947, com o enredo Escrava Rainha. Na bateria iam uns 30 ritmistas, quantidade que na época já dava para impressionar um pouquinho. O prêmio oferecido pela Prefeitura do então Distrito Federal era de trezentos cruzeiros, mas isto para a Vila não teve a menor importância, porque ela foi classificada em 13º lugar. Mas não desistiu.

De 1946 para cá a Vila começou uma trajetória nem sempre muito fácil ou brilhante. Em 49 consegui o 6º lugar com o enredo Iracema, em 1950 subia para o 4º posto com o enredo Baía de Guanabara. Em 1951 o tema escolhido foi Liberdade do Trabalho, em homenagem ao Presidente Getúlio Vargas, mas no dia do desfile caiu um aguaceiro daqueles e os carros alegóricos não conseguiram chegar à cidade, fato que prejudicou a escola, que voltou para o nono lugar.

Em escala descendente, a partir daí, a Vila baixando, baixando, até atingir o 18º lugar em 1954, com o enredo Último Baile da Ilha Fiscal, e quase foi mesmo... Mas o ânimo do pessoal não arrefeceu, o lema era o verso do poeta Noel:

A vila não quer abafar ninguém,
Só quer mostrar que faz samba também!

A escola só voltou a conhecer o gosto da vitória em 1960, quando conseguiu o primeiro lugar na Praça Onze com o enredo Poeta dos Escravos. Entre idas e vindas pelos grupos que compõem os desfiles oficiais, a Vila nunca obteve o primeiro lugar entre as supercampeãs, mas já fez carnavais de grande beleza, como em 1977, quando Arlindo Rodrigues apresentou o tema Ai, Que Saudades Que eu Tenho!

Assim como a Unidos de Vila Isabel, outras escolas ainda não conheceram a alegria de uma vitória consagradora, não obstante os bons enredos e os belos sambas levados à Avenida. É o caso da Unidos de São Carlos, da Em Cima da Hora, da União da Ilha do Governador, da Mocidade Independente de Padre Miguel e da Imperatriz Leopoldinense. Mas todas, nos seus esforços, contribuem para o momento grandioso que é um desfile das escolas de samba.

MARTINHO DA VILA


Martinho José Ferreira pode dizer que é graduado em escola de samba. Desde menino que travou conhecimento e intimidade com todos os instrumentos de percussão. Não há mistérios pra ele. Quando saiu dos Aprendizes da Boca do Mato e foi para a Unidos de Vila Isabel, chegou com o curso feito, tornou-se o Martinho da Vila, cantor do povo, das alegrias e das aflições, da gente quem ele nunca renunciou.