domingo, 30 de janeiro de 2011

A parada estratégica do BregArmando


Na quinta-feira, dia 20 de julho de 2000, o poeta Simão Pessoa publicava a seguinte matéria no jornal Amazonas em Tempo:

Nesta quinta-feira, a partir das 20 horas, o Bar do Armando vai reviver os áureos tempos da extinta boate Shangri-Lá, com a apresentação dos cantores amazonenses Afonso Toscano, o Rei do Partido Alto, e Aluisio Aguiar, o Rei do Bolero.

Será a última apresentação do badalado projeto BregArmando antes da eleição municipal.

É que para não se comprometer com nenhum dos oito candidatos, o comerciante Armando Soares programou passar três meses em Portugal.

Depois, se tudo correr bem, ele deve emendar e “conhecer a Europa propriamente dita”, como gosta de esclarecer o confrade Luís Saraiva, no programa semanal “Portugal Sem Passaporte”.


Como todo mundo sabe, o festejado cantor e compositor Afonso Toscano, autor dos principais hits da BICA, sofreu um acidente doméstico há três anos, ficando impossibilitado de tocar violão.

Depois de muita fisioterapia, ele vai fazer sua reestréia na noite tendo como parceiro Américo Madrugada e um repertório calcado no melhor do partido alto (Fundo de Quintal, Zeca Pagodinho, Almir Guineto, Lecy Brandão, Jorge Aragão e outras feras).

O grupo Demônios de Tasmânia vai fazer o acompanhamento musical, sob a regência do maestro Manuel Batera.


Chicão Cruz, Armando e Aluisio Aguiar

Conhecido como o Rei do Bolero, o ex-investigador de Polícia Aluísio Aguiar se notabilizou na década de sessenta quando fazia parte do trio de ferro conhecido como “Esquadrão Argos”, a elite da Polícia Civil.

Ao lado de Geraldão e Salu Omar, Aluízio era responsável pelo combate à contravenção (jogo do bicho, jogo da pretinha, briga de galos) tendo, inclusive, num Domingo de Ramos, prendido uma perigosíssima quadrilha de empinadores de papagaio, liderada pelo famosa Russo, o inventor do cerol-navalha (linha oito com vidro moído de bolas de árvore de Natal).

Sempre usando terno de giz riscado com colete de gabardine, sapato bicolor impecavelmente lustrado e um inseparável chapéu estilo Nat King Cole, Aluísio era a própria distinção em pessoa, e seus dois parceiros não ficavam atrás.

Durante cinco anos seguindos, o falecido colunista Nogar, do venerando Jornal do Comércio, os elegeu “os três mais elegantes da Polícia Civil”.

O vozeirão afinado do cantor logo chamou a atenção do radialista Clodoaldo Guerra, que o contratou para ser a principal atração do programa “Confusão na Taba”, que rolava nas tardes de sábado, no Cine Ipiranga, na Cachoeirinha.

Com a experiência adquirida no palco, Aluísio Aguiar passou a abrir shows de Waldick Soriano, no Acapulco, no Selvagem e na União Esportiva de Constantinopla, em Educandos.

Hoje, trinta anos depois dessa fase heróica, Aluísio contabiliza já ter participado de shows com Miltinho (seu padrinho musical), Cauby Peixoto, Nelson Ned, Ângela Maria, Márcio Greick, Agnaldo Timóteo e Nelson Golçalves, entre outros.

Com quatro LPs e três CDs já lançados, Aluísio Aguiar é expert no gênero bolero, um dos avôs do mambo, do chá chá chá e da salsa.

O ritmo nasceu na Inglaterra, passando pela França e Espanha com nomes variados (dança e contra-dança).

Mais tarde, um bailarino espanhol, Sebastião Cerezo, fez uma variação baseada nas Seguidillas, bailados de ciganas, cujos vestidos era ornados com pequenas bolas (as boleras), daí surgindo o nome que se popularizou com Bienvenido Granda, Lucho Gatica e Gregorio Barrios.

Muito popular entre o final dos anos 40 e a metade da década de 60, época do sucesso dos musicais de Hollywood, o bolero caiu em desgraça com a chegada do rock.

Foi quando essa história de homem segurar a mulher pela cintura e rodopiar pelo salão virou coisa de mané.

Naquela época, adolescente não curtia rádio. Rádio era acompanhamento musical de pelada na rua, antes da matinê.

Rádio era o que as nossas mães ouviam na cozinha, enquanto líamos gibis ou jogávamos futebol de botão.

Tínhamos a maior simpatia pelo fato de a porta do barraco de Silvio Caldas não ter trinco, mas – o que é que a gente tinha a ver com isso?...

Cauby Peixoto se descabelava todo procurando por uma certa Conceição, e isso era ótimo se você estivesse fantasiado de pirata pulando com uma havaiana no baile da Kamélia, intoxicado de lança-perfume até a alma, mas – e em junho?...

Melhor mesmo era suspirar pela Conceição, essa sim, minha vizinha, então na exuberância dos seus treze anos, e repetir, aos berros “deixe essa boneca, faça-me o favor, deixe isso tudo e vem brincar de amor, de amor, de amor”. Oh, yeah!

Quem queria saber de “perdóname si alguna vez sin quererlo te engañé...” se podíamos cantar “vinha voando no meu carro quando vi pela frente, na beira da calçada um brotinho inocente”?

Tá certo que alguns boleros diziam que “uma mujer deve ser soñadora, coqueta y ardiente...” e a gente, no escurinho do cinema, bem que gostaria que as Zenaides, Lucianas e Silvinhas fossem um pouco mais “coquetas y ardientes..”, mas não era bem melhor o ufanismo de “cabelo na testa, sou o dono da festa, pertenço aos dez mais, ai, ai, ai”?...

De qualquer forma, Aluísio Aguiar promete contar e cantar em duas horas o que foi e como foi que houve essa – sejamos cruéis, a vida é cruel –, essa cafonália, essa breguice, essa kitscheria embolorada, que vem lá de Ernesto Lecuona, Agustín Lara, Mario Clavel, Maria Grever, Armando Manzanero, até dar nas finas estampas de Caetano Veloso. Eu, hein, Rosa!

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