quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Carnaval 2008 - Arca da Lambança


Em meados de 2007, o subsecretário municipal de Educação, Sergio Freire, publicou um artigo na mídia intitulado “Arca de Noé”, em que criticava duramente alguns tipos de professores.

O artigo foi logo replicado em dezenas de blogs e gerou tanta repercussão negativa, que Sergio Freire foi obrigado a pedir exoneração do cargo. Leiam o texto:

O mundo ia acabar e Noé, reencarnado, foi convocado novamente. Dessa vez foi pedido a ele que colocasse na Arca professores. Um de cada tipo. Acostumado a salvar animais do dilúvio, Noé resolveu fazer uma correspondência dos tipos de professores com os tipos de animais para lhe facilitar a vida.

O primeiro que Noé encontrou foi o professor-coruja. Esse professor é um sabe-tudo e nada tem a aprender com ninguém. Crê que já galgou o conhecimento e pronto. Vive corrigindo todos do alto de seu pedantismo. Desconfiou, claro, quando soube do dilúvio. Como era possível que ele, que tudo sabia, dele não soubesse?

O diligente Noé continuou cumprindo sua missão. Deparou-se com o professor-preguiça. Folgado, o preguiça enrola pra tudo. Sempre faz no seu ritmo, pouco se importando com os outros. Faz par com ele o professor-avestruz, que evita assumir responsabilidades. Sempre que isso se lhe impõe, enfia a cabeça na terra e faz de conta que não é nem com ele.

Trabalho mesmo foi convencer o professor-galo a subir a bordo. O galo é travoso, posudo e vive a entoar discursos contra a globalização e o neoliberalismo, mas dar aulas mesmo que é bom, nada. Acabou entrando, mas não sem antes pendurar na Arca uma faixa vermelha com frases de protesto, sua especialidade. Depois do galo, subiu o professor-pavão. Extravagante, o pavão faz tudo para aparecer. Impossível não notá-lo.

O professor-cobra também foi à Arca. Por Noé, o cobra não iria, pois é venenoso e maledicente. Mas Noé estava cumprindo ordens e o cobra ficou. Outro convidado a contragosto a embarcar foi o professor-urubu. Como todos sabem, o urubu gosta de carniça, da coisa podre. Faz parte do grupo do quanto pior, melhor. É catastrófico e tudo para ele é razão do apocalipse. Ele ficou feliz com o iminente dilúvio porque a perspectiva do fim do mundo, justificativa que sempre o impediu de trabalhar, estava virando realidade.

E assim foi. Entraram ainda o professor-anta, que é professor não se sabe como, o professor-lombriga, que por qualquer coisinha tira uma licença médica, o professor-borboleta, que fica ali quietinho na sua crisálida, alheio à floresta que o cerca como se nada fosse com ele. Vieram ainda o professor-hiena, que ri de tudo, o professor-onça, que ensina na base do medo, e o professor-leão, líder dos outros professores.

Chegaram juntos o professor-morcego, que voa às cegas e dá aulas sem prepará-las, o professor-peixe, que se não estiver num ambiente 100% perfeito não sobrevive (e até agora me pergunto porque salvar um peixe do dilúvio) e o professor-aranha, que gosta de pôr armadilhas para seus alunos caírem. Muito aplaudido foi o popular professor-cigarra, que com seu violão sempre anima as culminâncias pedagógicas.

Quando a Arca já ia sair, alguém se lembrou de avisar Noé que ele havia esquecido o professor-formiga. O formiga faz seu trabalho individual, mas pensando no coletivo. É eficiente sem muito alarde. Noé parou e foi buscá-lo. Se os outros estavam na Arca, por que logo o formiga, o exemplo, ficaria de fora? Se bem que na vida real, quase sempre os outros não deixam muito espaço para ele mesmo. Suspeita-se até que está em extinção. Poucos sabem, mas o nome da Arca de Noé era Escola.


Se o artigo do Sergio Freire provocou polêmica, as brigas políticas entre o governador Eduardo Braga (PMDB) e o prefeito Serafim Corrêa (PSB) já estavam passando dos limites.

Criticando a demora na conclusão do viaduto da rua Paraíba, uma obra municipal, o governador deu a entender que a prefeitura de Manaus estava sendo administrada por um jumento.

Serafim deu o troco, dizendo que Braga tratava seu auxiliares aos coices, como um verdadeiro cavalo.

Principal deputado oposicionista na ALE, o comunista Eron Bezerra foi cooptado pelo governo e se transformou em secretário de Produção Rural.

Como todo bom stanilista, Eron aparelhou a secretaria com seus camaradas e passou a defender com unhas e dentes o governo estadual, principalmente o programa Bolsa Floresta, que pagava R$ 50 para as famílias de ribeirinhos impedirem o desmatamento nas áreas protegidas.

Depois de sofrer duas derrotas consecutivas (em 2004, para Serafim Corrêa na disputa pela prefeitura, e em 2006 para Eduardo Braga, na disputa pelo governo), Amazonino Mendes buscava uma sobrevida política de olho na disputa pela prefeitura no próximo ano.

Como os fins justificam os meios, ele aliou-se ao ministro Alfredo Nascimento, que estava sendo detonado implacavelmente pela mídia por causa do estado lamentável das rodovias federais.

Inventor do “mensalinho baré”, o ex-deputado José Melo agora estava pleiteando uma vaga no Tribunal de Contas do Estado (TCE), pelos bons serviços prestados ao governo.

Pra completar, em outubro de 2007, o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Amazonas (OAB-AM), Aristófanes Castro Filho, foi ameaçado de morte depois que descobriu uma fraude em 94 carteiras da OAB no Amazonas.

Muitos advogados da cidade usavam carteiras falsas, vendidas por um funcionário da Ordem pela bagatela de R$ 10 mil.

Entre os supostos compradores da carteirinha estava Ana Lúcia, filha do comerciante Armando Soares.

A BICA já tinha matéria prima suficiente para fazer seu enredo daquele ano: “Arca da Lambança”.


Gracionei Medeiros e Deocleciano Souza no coração da muvuca

No dia 3 de janeiro de 2008, quinta-feira, o jornal A Crítica publicou uma matéria intitulada “Ensaios da Bica começam hoje”, de autoria do jornalista Omar Gusmão:

Os biqueiros de todas as raças, credos e teor etílico já estão se reunindo. Após o lançamento oficial da letra da música da BICA, realizado na última sexta-feira, os ensaios para a mais tradicional banda de rua de Manaus têm início hoje e se repetem todas as quintas-feiras até o dia da Banda Independente Confraria do Armando (BICA) colocar seu bloco na rua, o que esse ano acontece no dia 26 de janeiro.

Quem é biqueiro de outros carnavais já conhece bem o clima dos ensaios: a banda Demônios da Tasmânia, especializada em antigas marchinhas, frevos e sambas-enredo, se encarrega de transformar o Bar do Armando em um templo da mais tradicional folia. A axé music, que praticamente monopoliza o carnaval de norte a sul do País atualmente, não é convidada para a festa biqueira. Afinal, há mais de 20 anos a BICA atua como foco de resistência da autêntica brincadeira folgazã, que é o verdadeiro carnaval de rua.

Lambança

Com o tema “A Arca da Lambança”, a banda mantém a tradição de ironizar em seus hinos oficiais acontecimentos políticos ocorridos durante o ano. O foco das críticas esse ano se dirigem especialmente ao Governo do Estado e projetos polêmicos como o Prosamin e a construção da ponte sobre o Rio Negro.

A BICA surgiu em 1987, por iniciativa de alguns freqüentadores do Bar do Armando, que decidiram criar uma banda para reunir os amigos e brincar o carnaval sem depender de programações oficiais do Governo ou de clubes. Como os fundadores da banda costumavam se reunir no Bar do Armando tendo a crítica política como um dos temas recorrentes e prediletos, a banda acabou também ganhando esse cunho político. Todo ano, a diretoria escolhe um fato político, nacional ou local, para ser o tema do carnaval da banda, sempre com muito humor.

Letra apócrifa circula

Uma letra de música totalmente sem autenticidade tem circulado em Manaus como sendo a letra da música oficial da BICA para 2008. Chegou até ser a ser publicada na edição de ontem de um jornal da cidade. A diretoria da banda, contudo, rechaça a letra apócrifa e desautoriza seus autores a falar em nome da banda. Para que não reste dúvida, confira ao lado – agora, sim, em primeira mão – a letra oficial. (Na matéria, Omar Gusmão publicou a letra atribuída ao falecido biqueiro Zequinha da Capri)


No dia 4 de janeiro de 2008, sexta-feira, o jornal Amazonas em Tempo publicou a matéria “Bica esquenta a Arca da Lambança”, de autoria da jornalista Isabella Siqueira:

A “Arca da Lambança” transbordou de alegria, na noite de ontem, no segundo esquenta da Banda Independente Confraria do Armando (BICA).

A confraternização foi embalada pela banda Demônios da Tasmânia e invadiu a Rua 10 de Julho, no Centro, onde mais de 200 pessoas participaram da festa que entrou pela madrugada. E isso foi só o esquenta.

A banda, que este ano desfila dia 26 de janeiro, tem como principal característica as irreverentes marchinhas de carnaval que satirizam situações de destaque na cidade.

Na folia de 2008, a Bica tem uma letra “oficial” escrita por Zequinha da Capri, um codinome usado pelos músicos para evitar polêmica.

O enredo fala da construção da futura ponte que liga Manaus a Iranduba.

Porém, uma outra letra, também “oficial”, de autoria dos jornalistas Mário Adolfo e Simão Pessoa em parceria com Edu do Banjo foi divulgada: o enredo faz uma alusão a um artigo do ex-subsecretário municipal de Educação, Sérgio Freire, onde comparou os servidores do órgão com animais da Arca de Noé.

“Somos um local que transpira criatividade e aqui existe democracia. Temos uma letra oficial, mas o que chegar aqui se for de bom resultado irá também ser tocado”, afirmou o jornalista e biqueiro Deocleciano Souza.

Na próxima quinta-feira (10), será lançado o CD oficial com o enredo da banda e até o fim do mês, sempre às quintas-feiras, haverá o esquenta da BICA.

“Aqui todo dia é festa, mas a nossa brincadeira, que começou pequena, se tornou hoje uma das atrações do carnaval local. O esquenta começou apenas como uma reunião de amigos e atualmente faz parte do calendário da banda”, ressaltou Marco Gomes.

No ano passado, aproximadamente 40 mil pessoas acompanharam o desfile da BICA. Mesmo a forte chuva que desabou no dia não impediu que os foliões participassem da festa.

Este ano, os organizadores esperam um público muito maior, já que a BICA é a única banda de rua que não cobra ingresso. “Aqui todo folião é bem-vindo”, enfatizou Diocleciano.


No dia 5 de janeiro de 2007, sábado, no endereço simaopessoa.blog.uol.com.br, publiquei a seguinte nota explicativa:

Dá licença, mas vou colocar os pingos nos is. Como parte da nova tradição – o fato acontece há cinco anos –, a Banda Independente Confraria do Armando (BICA) vai ter duas ou mais marchinhas “oficiais” tocando nos ensaios, nas quintas-feiras, para o público escolher democraticamente a melhor.

É que nem o sistema cáucus no estado de Iowa: quem reunir o maior número de votos em cada noite é declarado vencedor.

Como serão três ensaios (ou prévias), espera-se uma disputa acirrada entre os, amigos, fãs e – principalmente – familiares dos compositores das marchinhas envolvidas na encrenca.

No desfile pra valer, no sábado magro, a marchinha escolhida pelo público fica com 60% do tempo de execução, sobrando 40% para as demais.

Por enquanto apenas duas marchinhas entraram em campo, mas Mika de Manaus, Américo Madrugada e Paulo Onça estão trabalhando para fazer bonito. Vamos aguardar.

A primeira, com jeito de marcha-rancho das antigas, leva a autoria de Alessandro Almeida, Davi Almeida e Afonso Toscano, mas foi creditada a biqueiros já falecidos como Zequinha da Capri, Beto Beiçola e Armando Burégio. Curtam:



Arca da Lambança

O carnaval do arromba
É só na minha BICA
E a arca da lambança a balançar
Mostrando que vai ter suruba
Na construção da ponte
Que vai lá pra Iranduba

Ai, ai, minha BICA, ai, ai!
Quem pula nessa BICA
Canta, grita, nunca sai!

Manaus, ô Manaus
Do Sarafa ao Cadeirudo
Já perdeu a esperança
De Bélle Époque
Virou Arca da Lambança

Tem deputado lambanceiro
Tem cascateiro vereador
E é descarado o Zé Meloso
É muita abacaba no Fala, Governador!

O Armando disse e a Lurdes confirmou
O Prosamim que o Dudu fez alagou
Mas na BICA todo mundo canta
Só um iceberg afunda a Arca da Lambança

Ai, ai, minha BICA, ai, ai!
Quem pula nessa BICA
Canta, grita, nunca sai!

A segunda, com jeito de marcha-frevo recifense, leva a autoria de Mário Adolfo, Simão Pessoa, Edu do Banjo e Mestre Pinheiro, e sua autoria foi atribuída a Wagner Cristiano, Nestor Nascimento e Chico Pacífico:




Arca de Noé

(Lá vem o Ganso passo aqui passo acolá
Lá vem o Ganso para vice já não dá)

A minha BICA virou Arca de Noé
Zé Melo não é burro
Quer mamar no TCE
A coisa está ficando um horror
Tem jumento que é prefeito
Cavalo, governador

Ai dotô que desengano
Tá dando tudo cá na BICA do Armando
Pra bicharada comunista tudo é festa
Ontem fez revolução hoje faz Bolsa-Floresta

Caboco não é mais mané
Dudu paga 50
Pra manter o pau em pé

Sarafa é um grande elefante
Faz tromba d’água e viaduto estressante
Sarafa quando cava, cava fundo
Mas onde bota a pata sai phodendo todo mundo

Amazonino agora é morcego
Já não voa e nem faz cera
Quer voltar pra prefeitura
Chupando o sangue do cabo Pereira

Quem vai querer
Armando tem x-porco
E carteirinha da OAB.

Nas duas marchinhas, todas as desgraceiras da cidade e do Estado foram devidamente abordadas: da ponte Manaus-Iranduba às lambanças do programa radiofônico “Fala, Governador!”, do sonho de consumo do vice-governador Omar Aziz (codinome “Ganso”, na época do PCdoB) que agora quer ser prefeito ao desejo oculto do supersecretário Zé Merenda, que agora quer ser conselheiro do TCE, do programa de saneamento dos igarapés de Manaus (Prosamim) ao eterno retorno da depressão pós-Belle Époque, da educação-Socila do Cadeirudo às asnices atávicas de nosso alcaide, do neo-comunismo vigente na Secretaria de Produção Rural (bença, comandante Eron!) ao namoro entre o ex-cabo e hoje ministro de Transportes Alfredo e o ex-abelha e hoje candidato a chupa-sangue Amazonino, da venda de carteiras falsas da OAB ao “micado” programa Bolsa-Floresta.

Uma zorra total! O resto é intriga da oposição. Evoé, Momo!


No dia 14 de janeiro de 2008, segunda-feira, o Blog do Holanda publicou uma notinha dando conta de que a marchinha de nossa autoria – e a única que estava tocando nas rádios de Manaus – havia sido proibida de ser executada nos ensaios da BICA.

Supostamente, a letra ofendia a honra do comerciante Armando Soares.

Quase uma centena de leitores se manifestaram, 80% deles defendendo a nossa letra e detonando as pessoas que haviam feito a cabeça do comerciante para vetar a marchinha.


Mario Adolfo escrevendo a resposta ao Blog do Holanda, sendo assessorado por Edu do Banjo

No mesmo dia, o Blog do Holanda publicou uma segunda notinha intitulada “A censura na versão de Mário Adolfo”:

Mário Adolfo, o pai, escreveu em 14/1/2008, às 16:19, no menu BLOG:

Meu caro Holanda, acabei de ler os comentários sobre a censura à marchinha da BICA.

Lamento toda essa polêmica, até porque freqüento o Bar do Armando desde 1976, quando ainda era estudante e sempre nutri pelo portuga Armando e dona Lourdes um carinho muito grande, porque na sua forma de gostar, sei que eles sempre gostaram da rapaziada que freqüenta o bar.

O Bar do Armando, nos anos de chumbo, era o espaço onde a gente discutia abertamente e, dependendo das ampolas de cerveja entornadas, derrubávamos a ditadura toda sexta-feira.

Por isso lamento tudo isso e quero dizer que em nenhum momento eu, Simão Pessoa, Edu do Banjo ou Pinheiro tivemos a intenção de enxovalhar a família Soares.

Ao contrário, vimos essas meninas crescerem no bar e temos carinho de irmãos por elas.

Pelo menos algumas coisas precisam ficar claras nessa história: ao contrário do que cita o sr. Tião, em nenhum momento a Arca da Lambança “cita” o nome de Ana Lúcia.

No dia do esquenta, a própria Ana abraçou a mim e ao Simão, pediu desculpas pelo mal estar e disse que não se sentia ofendida em nada com a letra da música. “Você conhece minha mãe, ela é assim mesmo”, disse Lucinha. Também não culpo o Armando e muito menos dona Lourdes.

Algum “Salieri”, com inveja do barulho que nossa marchinha faria (como está fazendo, domingo pelo menos três rádios de Manaus a executaram) fez a cabeça dos dois para tirar proveito da situação.

Se dona Lourdes ou o Armando ouvirem a marcha – que não deixaram a gente apresentar no ensaio da BICA –, também admitirão que não tivemos a intenção de ofender sua filha. Mas não podemos é nos autocensurar.

O caso das carteirinhas da OAB foi o assunto mais polêmico de 2007, e satirizar as grandes manchetes e acontecimentos sempre foi a verve da BICA, que já fez troça com governadores, prefeitos, senadores, poderosos de um modo em geral e eles sempre entenderam o espírito da coisa.

No mais, brinco carnaval na BICA há 20 anos e, pelo menos seis das marchinhas têm letra minha (algumas delas com o Simão), e não pretendo abandonar aquilo que ajudei a construir e onde fui tão feliz.

Meu medo é que carnaval é uma brincadeira de três dias. Mas a história das tiranias atravessam o tempo.

Por isso, a diretoria da BICA deve repensar e fazer valer o espírito democrático e bom humor da banda mais irreverente da cidade.

Um forte abraço!


Mestre Pinheiro, Edu do Banjo e Duduzinho do Samba fazendo uma apresentação ao vivo para a TV Amazonas da marchinha censurada

No dia 16 de janeiro de 2008, quarta-feira, no blog picica.net, de Rogelio Casado, foram publicadas as seguintes notas:

Sujou! Censura na Banda da BICA…


Putiteba! Censuraram a música do Mario Adolfo e do Simão Pessoa na BICA... Vai dar caca!

Censura na BICA: a dor de Mário Adolfo


Sem concorrência, a BICA 2008 sai com uma marchinha que peca pela falta de criatividade. No dia decisivo para escolha da letra da marchinha da BICA 2008 (Banda Independente da Confraria do Armando), foi dado o golpe fatal nas pretensões de Mario Adolfo e Simão Pessoa de concorrer no mais disputado concurso do gênero.

Na verdade, nunca houve concurso. Em todos os carnavais, embora várias composições concorressem, uma delas já havia sido escolhida previamente pela diretoria da banda. Na maioria das vezes a produção da letra e música era feita de maneira coletiva. Milagrosamente não havia litígio.

Era o tempo em que juntavam-se compositores da pesada como Afonso Toscano e Celito, para ficar em dois dos mais criativos da ala de compositores que pela banda passaram. Sem contar com Américo Madrugada, gênio da raça, sempre na regra três por motivos até hoje nunca esclarecidos.

Um detalhe pitoresco da história da banda mais politizada do carnaval amazonense: os compositores nunca foram nomeados, para evitar que sobre eles recaíssem a ira das autoridades de plantão. Até hoje usa-se como expediente atribuir aos mortos ilustres que frequentavam o Bar do Armando (bar do português mais abrasileirado do norte do Brasil) a autoria das letras.

O histórico da banda tem outro detalhe sórdido: quem passar mais de uma semana sem aparecer nos colóquios litero-etílicos-musicais do botequim tá ferrado, torna-se quase persona non grata. Compositor faltoso costuma ser punido com a suspensão do direito à liberdade de expressão. Talvez por isso, o decano Deocleciano Bentes de Souza, que não é compositor, mas é um dos bambambãs da banda não perde uma rodada.

Foi assim que o ex-presidente do Sindicato dos Jornalistas Deco, como é conhecido um dos mais animados foliões da BICA, tornou-se uma espécie de general-da-banda. Costuma-se atribuir a ele poderes – de censor, por exemplo – que efetivamente não tem. Por uma razão. A banda tem um espírito anárquico: em lugar que manda todo mundo, não manda ninguém, ora pois!

Dito isto, eis que pintou um clima de cizânia na tropa de elite da banda. Os sujeitos dessa melodia já os nomei acima nessas mal batucadas linhas: de um lado Mario Adolfo, tendo com apoio o fiel escudeiro Simão Pessoa, dois notórios irreverentes, biqueiros de carteirinha.

O primeiro é amado e odiado pelas patrulhas ideológicas da cidade de Manaus.

O segundo é um dos mais respeitados jornalistas do Amazonas, que já comeu o pão que o diabo amassou na defesa da irreverência e do humor-nosso-de-cada-dia.

Do outro lado, os sujeitos estão mais ou menos ocultos.

Inconformado, Mário colocou a boca no trombone e expôs ao exame público a censura de que vem sendo alvo.

Sua expectativa é de que os biqueiros não deixem prosperar nenhuma forma de autoritarismo, censura e o escambau, sempre em defesa da liberdade de expressão.

Mas, caraléo, qual o motivo da discórdia?

Uma citaçãozinha besta sobre as carteirinhas falsas da OAB: “Quem vai querer/ Armando tem x-porco/ E carteirinha da OAB”.

Pegou mal censurar a marchinha “A Arca da Lambança” – composição de Mario Adolfo, Simão Pessoa, Edu do Banjo e Pinheiro.

Até a filha do Armando supostamente beneficiada pela maracutaia quase morreu de rir com o imbróglio criado por Lurdinha, sua mammy, que com a delicadeza habitual saiu em defesa do sacrossanto direito do uso da moita, já que ela não tem barbas para deixar de molho.

Enquanto isso, Arizinho Castro, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – seção Amazonas –, também biqueiro de carteirinha, ameaçado de morte pelos interessados na fraude, está sob proteção policial, sem poder ir à banda, que sai no sábado magro de carnaval.

Antes que pinte a maledicência, se liga aí, meu irmão: Lurdinha não tem nada a ver com isso. Boto fé!

Sabe-se que estão costurando um acordo para que a letra oficial seja tocada junto com a letra censurada. Entre mortos e feridos, salvar-se-ão todos: os justos e os pecadores. Amém!

Censurado e sem direito a uma gota de cerveja


Sacanagem – Muito puto, o multimídia Simão Pessoa, oferece queixa para o jornalista Deocleciano Bentes de Souza, o popular Deco – que paga o preço de ser ouvidor da BICA, na condição de general da banda: “Rapá, censurar letra de marchinha já é um negócio escroto, bicho, mas deixar o compositor sem cerveja, aí é sacanagem da grossa!”

Afonso Toscano comeu bola. Cumequié, meu cumpade?


O compositor Afonso Toscano comeu bola – Oops! Vamos esclarecer o episódio. Integrante da Tropa de Elite da Banda da Bica, Afonso é um dos responsáveis pela Brigada Anti-Negão Sangue Ruim – departamento que homenageia ex-governador do estado, inúmeras vezes tema da Banda –, que tem a missão de evitar o constrangedor jabaculê que costuma rolar na época do carnaval.

Pois não é que o gajo empolgou-se com a câmera fotográfica, tascou um pose de Negão Sangue Bão e, abestalhado, perdeu o lance que rolava às suas costas. Nem o fotógrafo imaginou que faria o flagrante do jabá responsável por tirar a composição do estimado jornalista Mário Adolfo do páreo da concorrência.

Mário pretende usar o registro como prova documental da censura que sofreu no carnaval da BICA 2008 no Tribunal de Apelação do Compositor Avacalhado pela Censura, tribunal que está ameaçado, pois um dos seus titulares demitiu-se arguindo suspeição: ele é compadre de Simão Pessoa, uma espécie de alter-ego do Mário Adolfo. Durma-se com um barulho desses.

Julgamento da letra censurada


Não parece assédio, mas é! – Mario Adolfo, sob o olhar maroto de Simão Pessoa, tenta seduzir Ana Cláudia, uma das filhas de Armando, patrono da Banda Independente da Confraria do Armando – BICA para que ela ouça a letra censurada e faça o seu julgamento: “A BICA sempre foi independente, querida, e você mora de baby-doll no meu coração!”

Dose dupla: censura e abstinência


Censura e abstinência alcoólica – As negociações para audição da letra emperravam, aqui e ali. Só uma coisa foi constante: a pena a que foram submetidos os compositores da letra censurada. Além da censura, os compositores foram forçados a abstinência do líquido precioso: cerveja, whisky, cachaça, tava tudo proibido. Ordens de Lurdinha. “Sai capeta que este corpo não te pertence!”

Vitória da liberdade de expressão


Obsessão – Mário Adolfo não descansou enquanto não fez Ana Lúcia Soeiro convencer o pai, Armando Soares, patrono da Banda da BICA, a dar uma trégua e deixar os compositores cantarem a música censurada. Na fotografia, à direita, Simão Pessoa e Marquinhos Jonhson cantam vitória.

Bebendo o próprio veneno


Insistência – Envenenada sabe-se lá por quem, Lurdinha, esposa do patrono da BICA, encarnou uma arara e ainda tentou impedir que a letra da música fosse cantada. Desta vez, o ouvidor e general da banda, Deocleciano Bentes de Souza, garantiu o direito de defesa do canto livre da letra censurada, sob uma condição: uma só voz, em posição de penitência, com direito a acompanhamento apenas do surdo. E mais, a escolha do intéprete era sua. A escolha recaiu sobre Petronila, símbolo sexual da BICA, no auge dos seus 82 aninhos. Deocleciano, como se sabe, foi educado no Colégio Salesiano Dom Bosco. Lá castigo era coisa séria. Lurdinha engoliu o próprio veneno, mas saiu satisfeita com a decisão.

A letra da música censurada na BICA


O tiro saiu pela culatra – As filhas do Armando, patrono da Banda da BICA, “amaram a letra da música”, como fez questão de ressaltar uma biba que estava ao meu lado: “Olha lá, olha lá, fotografa, elas amaram a letra da música”.

Leia a letra da música censurada e tire suas conclusões. Cá pra nós é muito mais criativa que a letra que venceu o concurso que não existiu, e nem nunca vai existir, senão não é a BICA.

A Arca da Lambança

(Mário Adolfo, Simão Pessoa, Edu do Banjo e Pinheiro).

Lá vem o ganso passo aqui, passo acolá /Lá vem o ganso pra ser vice já não dá (bis)/A minha Bica virou Arca de Noé/ Zé Melo não é burro/ Quer mamar no TCE/ A coisa está ficando um horror/ Tem jumento que é prefeito/ Cavalo governador/ Ai dotô que desengano/ Tá dando tudo cá na BICA do Armando/ Pra bicharada comunista tudo é festa/ Ontem fez revolução hoje faz Bolsa Floresta/ Caboco não é mais mané/ Dudu paga cinqüenta/ Pra deixar o pau em pé (bis)/ Sarafa é um grande elefante/ Faz tromba d’ água e viaduto estressante/ Sarafa quando cava, cava fundo/ Mas onde bota a pata sai fudendo todo mundo/ Amazonino é morcego/ Já não voa e nem faz cera/ Quer voltar pra prefeitura/ Chupando sangue do cabo Pereira/ Quem vai querer/ Armando tem x-porco/ E carteirinha da OAB (bis)

Apagando incêndio


Bombeiro – Com a Tropa de Elite da Banda da BICA dividida por suposta censura, os biqueiros encontraram no promotor Francisco Cruz o mediador que faltava para resolver o imbróglio. Segundo Cruz tudo não passou de vaidade de compositores e que ambas as marchinhas serão executadas. Ou seja: está garantido a execução da marchinha de Mário Adolfo, Simão Pessoa, Edu do Banjo e Pinheiro – Arca da Lambança. Resta saber qual delas será a oficial, a que ficará registrada no livro de ouro da BICA. Quem viver verá!


Mario Adolfo, Mestre Pinheiro, Simão Pessoa e Edu do Banjo no Bar Caldeira

Mas, afinal de contas, o que foi mesmo que aconteceu na noite fatídica daquela quinta-feira, 10 de janeiro de 2008?


Bom, desde que eu descobrira as delícias do Bar Snoopy, do meu velho amigo Oliveira, localizado a 50 metros de casa, eu havia deixado de frequentar o Bar do Armando.

Nos anos 90, Oliveira tinha sido dono do lendário Bar do Caldinho, na Praça 14, muito frequentado pelos funcionários da Prodam.

Eu costumava ir ao boteco na companhia do poeta Zemaria Pinto e do compositor Edvaldo Pagodinho, para curtir as animadas rodas de pagode comandada pelo grupo Pessoal do Jaqueirão.


Quer dizer, além de o bar ser de um velho amigo, no Snoopy havia 50 tipos de iscas diferentes (bolinho de bacalhau, bolinho de piracuí, casquinha de caranguejo, língua no bafo, carne seca desfiada, lombinho, arrumadinho de jabá, frango a passarinho, filé a provolone, cordeiro maturado, macaxeira frita e pratos de frios com linguiça apimentada, salame, queijo, mortadela, etc) enquanto o bar do português mantinha apenas a tradicional isca de leitão e queijo bola.

As cervejas do Snoopy são, atualmente, as mais geladas de Manaus (quase todas chegam na mesa tipo canela de pedreiro) e existe um batalhão de atendentes femininas, simpaticíssimas, para não deixar o seu copo secar.


O garçom Di Rato, um dos símbolos atuais do Bar do Armando

No bar do português era preciso implorar e oferecer propina para ser atendido por um dos dois garçons mal humorados do boteco (Montanha e Di Rato) e acabar bebendo cerveja morna.

A frequência do Snoopy também é de alto nível, com muitos profissionais liberais, escritores, jornalistas, advogados, promotores, mulheres saradas, socilaites, comerciárias, enfim, mais ou menos como era a fauna do Bar do Armando nos anos 80.

O fato de eu ter trocado o Bar do Armando pelo Bar do Oliveira, evidentemente, não me excluía das atividades carnavalescas da BICA, tanto que eu havia participado da criação das cinco marchinhas dos últimos cinco anos.

Naquela noite fatídica, eu nem estava disposto a ir ao Bar do Armando.

Eu havia passado na livraria Sebão de Manaus, comprado alguns livros e depois, em companhia do meu irmão caçula Simas, que trabalhava na livraria, e do Antonio Diniz, dono do sebo, fomos beber umas cervejas no Bar Caldeira, ali perto da livraria, onde me encontrei com o biqueiro Rochinha.

Ele me convidou a acompanhá-lo ao Bar do Armando, mas recusei, polidamente.


Simão Pessoa, Rochinha e Edu do Banjo no Bar Caldeira

Lá pelas tantas, fui surpreendido pela chegada de Mário Adolfo, Mestre Pinheiro e Edu do Banjo.

Eles haviam gravado o CD com a nossa marchinha e iriam fazer uma apresentação ao vivo no Bar do Armando, durante o ensaio da banda.

Tentei tirar o corpo foram com um argumento absolutamente indefensável:

– Porra, Mário Adolfo, eu estou aqui bebendo cerveja Antarctica gelada e você quer que eu vá pro Bar do Armando beber cerveja em lata da Brahma e ainda por cima quente? Nem pelo caralho...

– Mas é uma causa justa, meu brother! Eles andaram falando que a nossa música não vai tocar, mas com você lá comigo o papo muda de figura porque nós somos fundadores da banda! –, devolveu o jornalista.

Eu sabia que era uma canoa furada, mas resolvi ir. O Simas, mesmo a contragosto, resolveu me acompanhar. Não deu outra.

Além de não deixarem a música tocar no aparelho de CD (o sacana do Biafra, vocalista dos Demônios da Tasmânia, disse que não dava pra fazer ao vivo porque ainda não tinha recebido a partitura da composição para dar aos músicos...), o Armando simplesmente não quis nos vender cervejas.

Não se dando por vencidos, Mário Adolfo e Edu do Banjo começaram a ir comprar cervejas dos ambulantes da praça São Sebastião para beber dentro do boteco, o que me pareceu uma infâmia.

Caceta, a gente tinha se dedicado a promover a brincadeira nos últimos 20 anos e agora estávamos sendo tratados como cães leprosos?

Nocupardoca!

Com vinte minutos de impasse, chamei Mário Adolfo, Mestre Pinheiro e Edu do Banjo de lado e paguei geral:

– Bicho, se vocês quiserem ficar aqui, engolindo esse sapo, vocês ficam. Eu e o Simas estamos indo beber no Bar do Cinco Estrelas. Eu estou pouco me lixando pra essa merda toda. Eu não vim aqui beber de graça, eu vim beber cerveja quente pra ajudar a BICA, e pagando com meu parco dinheirinho ganho honestamente. O português não quer vender? Foda-se ele. O que não falta é bar nesta cidade...

Mário Adolfo disse que não arredaria o pé de lá enquanto não tocassem a nossa marchinha.

Eu e Simas fomos embora. Foi a última vez que entrei no Bar do Armando.


Jaques Castro, Mário Adolfo e o juiz Luiz Claudio Chaves, presidente da Banda do Boulevard


Jomar Fernandes e Edu do Banjo


Mário Adolfo e o radialista Souza, do programa Toque de Bar


Os mamulengos do Armando se encontram com os mamulengos de Coari


Deocleciano Souza e Dr. Santana se preparando para entoar o grito de guerra


O poeta e fotógrafo Marco Gomes


Afonso Toscano comandando o embalo


A Ala de Passistas Saradas da Vitória Régia


Vanessa Grazziotin, Serafim Corrêa e Mário Adolfo


A muvuca começando a pegar fogo


Mestre Pinheiro, Edu do Banjo, Silvanei e Mário Adolfo


Mestre Pinheiro dando um recado ao público


A vereadora Lucia Antony e Mário Adolfo


Rosângela Popopô e Serafim Corrêa


O povão celebrando o final apoteótico de mais um desfile da BICA

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