Mestre Marçal afinando o tamborim de Mestre Pinheiro
O sambista Nilton Delfino Marçal, o famoso Mestre Marçal, nasceu em 1930 no bairro carioca de Ramos, onde viveu até os 11 anos.
Depois morou em São Cristóvão, Olaria, Estácio, Inhaúma e Pilares.
Ele morreu em 1994, em Pilares, mas seu coração sempre esteve em Madureira.
Mestre Marçal, que ainda menino aprendeu a tocar cuíca, tamborim, surdo, tarol, pandeiros e tantos outros instrumentos de percussão, durante 22 anos comandou a bateria da Portela.
Mas por problemas políticos deixou a escola, em 1985, assim como outros portelenses ilustres.
Mestre Marçal deu a volta por cima alguns anos depois.
Foi para a escola de samba Unidos da Tijuca e, mais importante, no final dos anos 80 gravou os discos em que provava seu grande talento musical.
“Siga em frente sem retorno e sem parada/ Lembre que a água passada não move a pá do moinho, não/ Vá com Deus/ E siga pelo acostamento/ Que é pro arrependimento/ Não te achar na contramão”, cantou ele na bela “Pela Sombra”, de Nelson Sargento e Nei Lopes.
Nilton Delfino Marçal era filho do grande sambista Armando Marçal.
Ele fez uma homenagem ao seu pai gravando “Não Diga A Minha Residência”, uma deliciosa parceria do velho Marçal e de Alcebíades Barcellos, o Bide.
No início dos anos 90, Bosco Saraiva, presidente de honra do GRES Reino Unido, resolveu trazer Mestre Marçal a Manaus para ele fazer um seminário sobre os macetes da armação de uma bateria de escola de samba.
O seminário foi aberto a todos os diretores de bateria, pagodeiros e ritmistas da cidade.
O velho sambista iria passar apenas um fim de semana em Manaus.
Bosco Saraiva e Edu do Banjo chegaram ao aeroporto e receberam o mestre, com muita festa.
Enquanto ele ia ao banheiro, os dois pegaram seus tíquetes de despacho de bagagem e foram retirar as malas na esteira.
Quando concluíram a tarefa, levaram um susto: estavam com oito malas em três carrinhos.
– Porra, Edu, eu só mandei uma passagem, mas pelo visto o Mestre Marçal trouxe toda a Velha-Guarda da Portela –, cochichou Bosco.
Cinco minutos depois, quando o sambista retornou do sanitário e viu os dois ali, foi logo indagando:
– O que qui você estão fazendo aí parados? Vamos embora...
– E o resto da turma? Os donos destas malas? –, insistiu Edu do Banjo.
– Que resto o quê, rapaz? Isso aí são meus objetos pessoais, meus paletozinhos. Vamos embora que a gente está perdendo muito tempo...
No Hotel Imperial, enquanto os carregadores levavam as malas para o quarto, Edu não se conteve.
– Mestre Marçal, ainda que mal pergunte. Pra que foi que o senhor trouxe tanto paletó?
– Ah, meu filho, eu sou pobre, mas gosto de me trajar bem e ando sempre prevenido –, explicou o velho sambista. “Vamos supor que nessa noite de sexta-feira caia uma chuva ou faça um friozinho. Então eu coloco meu terno azul-marinho ou um outro marrom-escuro. Aí, vamos supor que amanhã, sábado, faça um sol bacana, bem bonito. Então, de manhã, eu posso usar um terno branco perolizado e à noite um cinza-grafite ou um verde-musgo. Aí, chega o domingo. Dependendo do clima, eu posso usar um terno risca-de-giz, ou um de cor salmão, ou um quadriculado ou um azul-turquesa. E, claro, pra cada terno desse tem de ter um sapato e um cinto para combinar. Sabe como é, né? Um homem prevenido vale por dez...”.
Bosco Saraiva e Edu do Banjo ficaram visivelmente impressionados com o estilo, o refinamento e a elegância do velho sambista.
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